segunda-feira, 9 de junho de 2025

Pega a visão!


Eu queria ser músico competente

de passar para o papel

as notas que vêm à mente

quando as andorinhas

ao chegar em migração

no Brasil tropical caliente

pousam nos fios de alta tensão.

Deve ser uma música muito louca

Pega a visão!

 

Deve ser uma música muito louca

Sobre aqueles que vivem no chão

Ou sobre paisagens estranhas

Em florestas e montanhas

ou lugares maravilhosos

Éden, Atlântida, Xangrilá…

Se ainda eu tivesse asas

voltaria para lá.

 

Será que realmente somos

O ápice da evolução???

Pega a visão!


Onde você pisa, nasce uma flor.



Meu bem, tô cuidando do jardim,

árvores atiram flores em mim,

rosas se abrem na roseira,

rádio toca música brasileira.

Os pássaros estão a cantar

Que a primavera chegará

Por isso comprei, meu bem,

Uns panos cheios de cores também,

Para você ornar

Com a primavera que logo vai chegar.

 

amor feito carinho não acaba, meu bem,

mesmo que venha a idade,

é começo de caminho

que continua na eternidade.

Mesmo que passe o tempo,

por qualquer lugar que for,

será fácil achar os seus passos:

onde você pisa, nasce uma flor.

 

Árvores do jardim atiram flores em mim

e por qualquer lugar que for,

será fácil achar os seus passos:

onde você pisa, nasce uma flor.



domingo, 8 de junho de 2025

O sopro do vento




Chega de brincar,
guarde essa bola,
passe para dentro de casa já

saia do quintal do planeta
porque algum irresponsável
deixou a camada de ozônio aberta
e  entrou o raio ultravioleta.

É de entristecer um quintal 
sem galinhas a ciscar,
sem roseiras a perfumar,
sem crianças a reinar,
e a coisa mais triste do mundo
é um balanço onde só o vento brinca.
só o vento brinca.
Um balanço vazio tocado pelo vento,
como se vento tivesse sentimento.

a coisa mais triste do mundo
é um balanço onde só o vento brinca.
só o vento brinca.
Um balanço vazio tocado pelo vento,
como se vento tivesse sentimento.


sábado, 7 de junho de 2025

Ânimo!



Na cidade do stress há uma viela

com casa, quintal, flores,

um cachorro, pitangueira,

pássaros cantores,

tem balanço em goiabeira

tem beija-flor e borboleta

e no balanço uma criança brinca

de vai e vem sobre o planeta.

 

O planeta mal pode esperar:

Criança aprendendo a andar,

passarinho aprendendo a voar,

filhote de peixe voltando ao mar,

futuro artista a caprichar

a humanidade a se irmanar.

 

O filho do Todo Amoroso,

Nasceu bem aqui no planeta Gaia.

Há mais mistérios no céu

do que grãos de areia na praia.

 

 

O Todo Amoroso, louvado seja,

escolheu nosso planeta Gaia,

Há mais mistérios no céu

do que grãos de areia na praia.


O itabirense


Carlos Drummond
(corrijam-me se erro)
tinha um coração de ouro
moldado na terra do ferro.

quinta-feira, 5 de junho de 2025

Menino curioso


Não soube o que responder

quando o menino Victor Félix

perguntou se o ouriço do mar,

que não tem pé nem cabeça,

é um bicho de verdade,

pois parece feitiçaria

de um pajé tupinambá,

que juntou espinhos da brejaúva

e construiu o bicho pindá.  

Memória sob cerração


Os anos depositaram camadas de névoas

nas lembranças que guardo de Maria Alice:

sardas, tranças no cabelo,

uma esquecida música,

e sorrisos sob laço de fita,

que a pátina do tempo transformou

em quadro impressionista.

 

MDCCCLXXX


Benedito Barba da Praia da Enseada,

(meu tataravô),

o que você caçou?

Um sorriso de mulher,

uma gaivota que mergulhou

e a tintureira apanhou.

Benedito Barba

(barba de desertor),

o que você caçou?

Um papo de baiacu,

um bote de jaracuçu

e aragem no vento sul.

Benedito Barba

(de sobrenome Bento),

o que você caçou?

Uma esperança no vento,

uma dose de espanta-tristeza

e viagem só de ida

para a Praia da Fortaleza.

Mata Atlântica

 


Esta mata tem segredos

que a ciência não explica,

esta mata tem medos

que a coragem não vence,

esta mata tem luzes

que espalham escuros

nas mentes das pessoas,

esta mata tem vozes

de seres que não existem.

Martinha Cabral


Lá vai Dona Martinha, minha avó,

com o pé no presente e a cabeça no passado.

Lá vai Dona Martinha

levando um galho de roseira

para plantar no jardim de alguém.

Lá vai a parteira Dona Martinha

abrir as janelas do mundo para algum neném.

Lá vai Dona Martinha a caminho da igreja

junto com Santa Teresinha.

Lá vai Dona Martinha levando mantimentos

tirados de sua despensa vazia

para quem precisa pôr a fome em dia.

Maria Galdina

 

 

No asilo do Sertão da Quina,

na páscoa de 1992,

com mais de cem anos de idade,

Maria Galdina partiu para o céu

deixou sua maior riqueza,

um conjunto de canecas de ágata

que ganhou na época da inocência,

quando todo estranho bem vestido

era chamado de doutor,

quando todo forasteiro era bem recebido,

quando se acreditava na gratuidade das intenções

e na boa vontade das pessoas.

E foi por isso que  Maria Galdina,

nascida na praia, morreu no sertão.

E foi por isso que Maria Galdina,

morta na Terra, renasceu no Céu.

Maria do Fidêncio

 

Maria Gaspar do Santos, 89 anos,

mora aos pés de Nossa Senhora de Ubatuba,

sua madrinha de crisma.

E a sua fé é tanta,

que já não conversa,

apenas canta,

mas com tanta emoção,

que revoadas de anjos e pássaros

ficam se tecendo no jardim,

só para escutar sua canção.

Nini

 


Maria Aparecida de Jesus,

minha prima Nini,

é um passarinho de olho na aurora

enquanto apura a cantiga

com sonhos de bailar a dança da vida

e vive a espalhar centelhas de luz,

porque já foi abraçada por Nosso Senhor Jesus.

Maravilhas de Deus

 


O mundo é mais bonito

visto com os olhos dos peixes

ou de um mergulhador.

Sob as águas o sol lança luz nas sombras,

revela as cores das algas

e arranca irisdescências

das escamas dos peixes.

É por isso que Benedito Félix,

de tanto ver as maravilhas de Deus

na baía da Maranduba,

resolveu dividir seu tempo

de pai, carpinteiro e mergulhador

com as funções de ministro

do Pai Eterno, o Criador.

Recados do vento leste

 

Às vezes o vento leste
traz aos nossos ouvidos
em permeio ao clamor
da arrebentação das ondas,
dos ruídos de refregas
de acontecidas batalhas navais,
das canções de marinheiros
de longitudes orientais,
cá para a América,
ecos distantes
das antigas vozes d’África.

Tempus fugit


Quem souber que dê notícias:
dos antigos leiteiros
que entregavam o leite
em garrafas de vidros
aos domicílios;
dos ceguinhos
e seus inseparáveis violões
fazendo escambo de músicas
por pouso e almoço;
dos mascates e suas malas
com cortes de panos,
tesouras de unhas
e  outros artigos
de primeira necessidade
para damas e cavalheiros
de fino trato.

Do progresso


Todo o dinheiro não compra,
toda  a técnica não monta,
toda a ciência não acrescenta
uma nota de melodia
à música do sabiá laranjeira,
um quinhão de conforto
à casa do joão de barro,
um pouco de beleza
à roupagem da saíra de sete lenços,
um tanto de graça
à elegância da garça.

Boitatá


Que fenômeno salta na rocha
e tremeluz feito tocha?
Que espécie de luzerna
corre sobre o mar
sem se apagar?
Que tipo de bicho
põe fogo no rabicho
só pra nos assustar?

Manoel Félix

 


Tio Manoel virou maneco

de tanto ver assombros

boitatás, mães do ouro,

estrelas cadentes,

visões de mouros,

pirilampos, peixes pampos,

abraços de tamanduás,

fila de marandovás,

correção de formigas quem-quem,

vozes daqui e dalém

das quais ficou só o eco

e Tio Maneco virou Neco. 

Maneco Almiro


Porque toda pessoa tem que ser um artista,

Tio Maneco Almiro empunhou uma rabeca

que trocou por um leitão

e tornou-se um astro da Folia de Reis.

Também era fogueteiro entusiástico

na festa do padroeiro São João Batista.

Acho que foram as suas bombas

que espantaram os anjinhos

que zelavam pelos pescadores

da Praia da Fortaleza.

Malasartes


 

Todas as árvores da mata atlântica

balançam animadas com a brisa do mar,

menos o guapuruvu

às margens do Rio Fortaleza,

só porque um menino pendurou

em um dos seus galhos,

uma gaiola de alçapão

e capturou uma ilustre visita,

o passarinho azulão.

Made in Pindorama

 


Samburá, tipiti, covo,

peneira, balaio, esteira,

de palhas, taquaras e cipós.

Quem faz um cesto

faz um cento.

 

Cidade moderna




Na grande cidade dos milhares de prédios-pombais

apertam-se pessoas solitárias ou casais,

em dezenas e até centenas de apartamentos

apartam-se famílias, histórias e sentimentos.

São moradas próprias ou sob aluguéis,

choros e festas são permitidos,

desde que não ultrapassem 50 decibéis.









terça-feira, 3 de junho de 2025

Propagação sísmica


Quando eu era muito novo,

diante da Baía da Fortaleza,

minha avó falou

que não se pode fiar

na mansidão do mar,

pois sua avó ouviu de sua avó

sobre um acontecimento

muito antigo,

alguma coisa

sobre o mar que se levantou

em ondas maiores

que a maior amendoeira,

e semeou mortandade

e destruição

e matou muito cristão.

Desconfio que

o que minha avó descreveu,

à maneira caiçara,

passados centenas de anos,

foi o maremoto de Lisboa.

Projeto de vida

 

Quando crescer

quero ser igual meu avô,

que acordava de madrugada

para trabalhar

na pesca ou na roça,

almoçava na hora certa,

descansava na hora da sesta,

na esteira,

ou na rede,

ou na cama,

para a salvação do corpo

e da alma.

De tarde remendava rede,

negociava banana e farinha,

fazia balaios,

tomava uma ou duas pinguinhas

e a noite o encontrava

dormindo com as galinhas.

Produtos das palmas

 

Das benditas palmeiras,

não bastassem os frutos,

há os palmitos, os esteios das casas,

os caibros, as ripas, as palhas

para cobertura dos chapéus

e outros tetos.

Procissão

 

Padres e Frades,

Anjos e Querubins (de faz de conta),

santos e pecadores,

estandartes e estudantes,

cheiro de rosa e jasmim...

parece até que Nossa Senhora

passou diante de mim. 

 

Procissão de Nossa Senhora do Sertão da Quina

 


Devotos entoam benditos,

três pombinhas descem do céu,

festeiros castigam os pandeiros,

opas e estandartes ao vento

e anjos no firmamento.

Uma criança fez um colar

com as flores da mariquinha da serra

e, de um jeito muito contrito,

o pôs no pescoço de Santa Maria,

que fez questão de ostentar

um sorriso muito bonito.

Primeiras leituras


Guardo na memória

os primeiros livros

tão caros e tão raros

de histórias de animais, árvores

e lugares fantásticos com

macieiras,

castelos,

baobás,

leões,

pontes de pedras,

oliveiras,

rouxinóis,

vacas leiteiras,

que, em meu conhecimento rudimentar,

situavam-se entre o mundo dos sonhos

e o antigo Reino de Zanzibar.

Presépio caiçara


O marulho das ondas

entra pelas portas abertas

da Igrejinha de São João

na Praia da Fortaleza

e embala o menino Jesus

que dorme tranqüilo,

em uma cesta de timbopeba,

dentro de uma casinha de pau-a-pique.

Os anjinhos curiosos,

com asas de penugem de galinha,

vigiam o sono do menino.

As ovelhas, a vaquinha

e o burrinho pastam

em um chão de musgos.

Baltazar, Belquior e Gaspar

andariam mais mil quilômetros

pela importância e beleza

do momento.

Nossa Senhora e São José

apreciam o conjunto,

um verdadeiro brinco

e abençoam o mundo

no natal de 1975. 

Presente do céu


Porque criança mistura

realidade com fantasia

e porque a boca não pôde falar

o que o coração sentia,

deixo aqui registrado

em forma de poesia,

que foi um anjo

que me deu o primeiro presente:

um carrinho de madeira

que achei no quintal de meus avós

sob um pé de laranjeira.

Presente do Céu


A bananeira é um pacote

que conforme cresce

vai se desembrulhando,

folha por folha

até revelar o segredo

de um coração em camadas

que, por sua vez,

também se desembrulha

para ofertar pencas de bananas,

o fruto do paraíso,

explicação para tanta gentileza,

segundo meu juízo.

Presente de pobre

 

Um favor é uma das poucas coisas 

que os pobres podem dar, 

assim dizia Vovó Martinha, 

ao sair para mais um serviço de parteira 

na Praia da Maranduba. 

Quando contei essa história 

ao professor Aziz  Ab'Saber, 

ele gostou e comentou: 

Como é fácil trilhar o caminho 

para o coração da gente, 

basta uma solidariedade simpática 

tão comum antigamente.

 


Prêmio


Pago a ira com sorrisos,

pago abraços com beijos,

pago o abandono com a atenção

e sei que estou no caminho certo,

pois quando saio às ruas,

as crianças me acham um igual

e as árvores das praças e jardins

jogam flores em mim. 

Preço alto demais

 


Quantos litros de cana?

Quantos alqueires de farinha?

Quantos cachos de bananas?

Quantas violas caladas?

Quantas redes recolhidas?

Quantos peixes não nascidos?

Quantos mangues aterrados?

Quantas chibas não dançadas?

Quantos reisados?

Quantas teses de mestrados?

Quantos bailados?

Quantos ranchos destruídos?

Quantos anos utópicos?

Quantas milhas devoradas?

Quantas vidas sacrificadas?