quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

No meio tem poesia




      pão, pão, pão, pão, pão.
  tomate, tomate, tomate, tomate.
alface, alface, alface, alface, alface.
      queijos e beijos de minas.
alface, alface, alface, alface, alface,
  tomate, tomate, tomate, tomate.
       pão, pão, pão, pão, pão.

O romantismo não morreu




Primeiro usou palavras doces
depois amargas,
misturou vitupérios e resmungos
e depois apelou por alianças.
Ganhou o anel dos nibelungos

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Crianças fazendo poesias






- Ginástica faz crescer moluscos.
- Popótis é um bicho que tem na África.
- Tem beijinho de estalar e também de comer.
- Eu quero corte de cabelo moicano, igual ao da girafa.


domingo, 28 de janeiro de 2018

Recado para Caim





Sou contra a arma de fogo,
já não basta a borduna,
a língua viperina
e a pedrada no meio das ideias de Abel?
Mas pra que fazer esse papel?


Quinto mandamento





Quando criança, com o estilingue na mão,
não fui matador por um triz,
mas graças ao anjo da guarda,
não sei se meu ou dos bichinhos
(ou foi S. Francisco de Assis?),
eu nunca acertei os passarinhos.


quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Naufrágio





Na rota do navio tinha um parcel
e lá no fundo ficou em repouso
o navio, as mercadorias, as histórias,
o que respirava perdeu o hausto
e o que era luxo perdeu o fausto.
Mas nem tudo é perda,
mesmo as cinzas dão forças para um novo embrião,
e o que continha vida pode pulsar de novo,
mesmo fazendo parte de outro universo.
No naufrágio vivem agora
a alga, o coral, o peixe, o polvo.


Mais amor


Antes de atirar a pedra
em Maria Madalena,
antes de usar o dedo sujo
para tirar o cisco dos olhos dos outros,
antes de cortar as árvores
sem ver seus frutos,
antes de condenar Lula,
que ninguém pode negar
que governou com poesia,
antes de jogar a pá de cal, 
aviso desde já, 
os sonhos não têm ponto final.

terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Poema para Lula












Você se lembra quando fazia escuro
e o alvorecer era incerto?
Você se lembra dos gritos de dor de Manoel Fiel Filho?
Da boca amordaçada de Vladimir Herzog?
Dos órfãos da camponesa Margarida Maria?
O que você fazia enquanto poucos corajosos
teimavam em apressar a chegada da manhã?
Como você vivia quando o pão era pouco
e a liberdade pequena?
Você sabe quem declarou: "meu sonho
é que nenhuma criança vá dormir com fome neste país"?
Você sabia que o sonho virou realidade?
Ai, mas hoje tem gente que exige prisão
para quem manteve erguida a bandeira da esperança
e que defendeu nosso time
no jogo contra a ganância dos egoístas.
Quero erguer os meus versos contra essa injustiça,
meus filhos nunca haverão de me acusar de ingratidão,
eu sei reconhecer um herói pelo pulsar de seu coração.

Poema para alegrar mamãe












Mamãe, é para você ficar contente,
Eu tenho sonhos a realizar
Entre o nascente e o poente.
Eu devia estudar
Os verbos e suas conjugações
Os números e suas variações
Ser aprovado no vestibular
Para ficar bem empregado
Para trabalhar engravatado.
Ter um bom futuro
Votar para presidente
Escolher o parlamento,
mas, mamãe, lamento,
o mundo está doente
e eu tenho sonhos a realizar
entre o nascer do sol e o poente.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

São João, rogai por nós







São João Batista, nosso padroeiro,
nunca ficava sozinho na capela
sempre havia alguém para fazer uma oração
ou para acender uma vela.
E nós vivíamos longe de tudo
na praia isolada da Fortaleza,
Nós, os acarás, os pitus
e todos os viventes dos rios;
as árvores, os pássaros, os bichos
e todos os viventes da mata;
os guaiamus, os filhotes de peixes
e todos os viventes do mangue;
os peixes, as tartarugas, os corais,
as algas, os moluscos, os crustáceos
e todos os viventes das costeiras e recifes,
e nós fazendo parte do ecossistema.
Mas, agora, São João Batista
está tão sozinho na capela
aflito com esse delicado equilíbrio,
vão lá fazer uma novena,
vão lá acender uma vela.







Tempo de sossegar





Quando vai ventar forte
as nuvens são cirros,
as estrelas tremeluzem,
os sapos começam a cantoria na gamboa
e Zé Grande, meu avô,
fica sossegado em casa e diz:
são férias de pescador.



domingo, 21 de janeiro de 2018

Projeto de voo


Seres alados
vinde para nossos telhados,
frequentais nossos jardins,
alegrais nossas vidas,
mostrais-nos que sonhar
é o primeiro passo para voar.
Pássaros, pilotos de asa-deltas, borboletas,
anjos, voejais sobre nós.






21/01/2016




Quando despertei
ainda era madrugada
e com a cara lavada
e a alma tinindo
tratei de fazer um café forte
e deixar a mesa preparada
para quando o sol nascer.

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Papo do menino Régis


Anjinhos do céu,
De Nossa Senhora os queridinhos,
quando escutei ruídos de asas lá fora
eram vocês ou os passarinhos?

Voo ao vento










Meu vizinho parece tantã,
pois fica olhando estranho pra mim
quando converso com os cachorros,
faço cafuné nos gatos,
assovio respondendo aos passarinhos,
danço na chuva
e tento levantar voo ao vento.
Quero ver a cara dele
quando conseguir o meu intento.

terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Moradia do tempo












Qualquer golpe de vento,
qualquer toque de anjo,
qualquer canto de pássaro,
qualquer raio de sol,
qualquer gota de chuva,
qualquer nota de viola,
abre a taramela
e escancara a janela
do quarto onde mora
minha memória
e minha saudade

Metamorfose










O vento agitou
os galhos do ipê
e uma flor cor de ouro
foi carregada pelo vento,
bateu asas
e diante de minha janela
transformou-se
em borboleta amarela. 

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Antigas leituras


 









É verdade que os caiçaras mais velhos eram analfabetos,
mas antigamente a leitura era outra,
os signos eram outros.
Liam-se os sinais do tempo
no comportamento do mar,
na direção do vento,
na cor do pôr-do-sol.
Liam-se as pessoas
conforme o coração.
Sabia-se das plantas
conforme suas serventias
e elas eram conhecidas
pelos nomes,
como se fossem velhas amigas.
Liam-se os animais
pelos respectivos sinais,
já os pássaros eram conhecidos
principalmente pelos ouvidos.
Cada pássaro com seu canto,
cada vivente com seu encanto. 

domingo, 14 de janeiro de 2018

Visita



Até 1970 São Pedro vinha
à nossa praia
para puxar rede,
rezar oração,
remar canoa,
desfiar cipó timbopeva,
fazer farinha,
tramar balaio,
contar causo,
tocar viola
e assoviar pro guaiá.
Novas visitas a combinar.

Poesia popular








Quando a gente dizia
que ia colher jabuticabas
Vovó nos lembrava
para deixar um pouco aos passarinhos,
e depois se ria.
Era assim Dona Eugênia,
não lia e nem escrevia,
então praticava poesia.

sábado, 13 de janeiro de 2018

Serrinha da Fortaleza









Tem um lugar na mata
esconderijo dos bichos
de onde, de vez em quando,
salta onça,
corre tamanduá,
pula veado
e cachorro-do-mato
é mato. 

Minha avó









Dona Eugênia,
com grande ciência,
cuidava da casa,
da horta, da fé
e costumava dizer
antes das refeições:
- Sem oração não tem pirão.

Mar nosso


 


A casa de meus avós navegava
em um mar de bananeiras,
cuja chaminé
soltava rolos de fumaça
e cheiro de pirão de peixe. 
A casa de meus avós
era uma embarcação
no oceano do bananal,
só percebida pela bandeira
do padroeiro São João
no mastro principal. 

Sofrê









Todas as árvores
da mata atlântica
balançam animadas
com a brisa do mar,
menos o guapuruvu
às margens do Rio Fortaleza,
porque ontem um menino pendurou
em um dos seus galhos,
uma gaiola de alçapão
e capturou uma ilustre visita:
o passarinho corrupião.

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Busca











Eu,
que há muito tempo atrás
senti o gosto
da garapa de engenho,
da farinha de mandioca
recém saída do forno,
da jabuticaba colhida na hora,
do café feito no fogão a lenha,
procuro rede de pescar,
casa de farinha,
rancho de canoa,
roça em coivara,
para voltar a ser
cem por cento caiçara. 

Cachoeira do céu




Na casa de meu avô
quem sempre nos deu
a água de beber
é uma cachoeirinha
que brota de uma grota
entre pedras, raízes e caetês,
que alimenta um córrego de guarus,
cobras d'água e pitus.
Uma queda d'água tão bonitinha,
com um rumorejar tão baixinho,
parecendo que foi feita por Deus
quando ainda era menino.

quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Consulta com o bom Dr. João










Da praia, da mata,
da Serra do Mar,
mudei para São Paulo,
estudei em São Paulo,
adoeci em São Paulo
e fui procurar o doutor.
Seu doutor me examinou
e na receita aviou
que diariamente
bebesse café
feito no fogão a lenha,
acompanhado de inhame
cará ou mandioca-doce,
que às refeições
tivesse escaldado
de peixe ou de galinha,
e de sobremesa
jabuticaba, goiaba, pitanga,
cambucá, cambuci, araçá,
ou fruta-do-conde.
Bom moço, obedeci,
e desde aquela época
nunca mais adoeci.

Caso de urutau



É preciso muito sentido
para não ser enganado
pelo bicho urutau
que em um instante é pássaro,
noutro é pedaço de pau.

Céu furado








Esse céu todo esburacado
deixando vazar luz
é obra do caçador Órion
depois que passou a usar
espingarda cartucheira
que espalha chumbo
por todo o universo.
Para confirmar, vide o verso.