domingo, 24 de agosto de 2014

Meu Deus, me dê







Uma mulher de gênio bom
que cuide do feijão e arroz
e deixe comigo o pirão,
uma roça de mandioca
pra ter sempre
farinha na barrica,
uma rede de tresmalho,
uma canoa caiçara,
um pesqueiro secreto,
uma viola pra pontear
e a bênção de São Pedro
para poder viver do mar.

O tesouro da Serra do Mar





Lusos,
Corsários
E grileiros,
Pela violência
Tomaram a terra
E tentaram descobrir
O segredo do tesouro dos caiçaras
Que só será revelado
Para quem gostar
Dos ruídos e piados
De bichos e pássaros,
De cheiro de mato
E de água cristalina
A murmurar no regato.

Viagem no tempo






No começo do século XXI
saí da cidade dos arranha-céus,
percorri a rodovia
onde a morte
disputa corrida
com os automóveis,
quatro horas depois
cheguei ao começo
do século passado
no Sertão da Picinguaba,
em tempo de tomar
café com garapa
acompanhado
de biju de mandioca
e peixe com farinha.

Nomes de passarinhos





Tio Benedito
Fogo-apagou
Bem-te-vi
Corruíra
Mariquita
Tiziu
Tico-tico
Siriri
Maria-já-é-dia
Tuim

Sem-fim.

Juruquivi






Na viração da manhã,
tuins brincando de gangorra,
nos galhos do tarumã,

Ouro e prata
dando em pencas
nas terras de meu avô

e, do galho da goiabeira,
em salto bungee-jumping,
pulou a aranha armadeira.

Minha casa tem




Árvores em frente
que se agitam com o vento
e atiram confetes na gente.

Uma rocha, cuspo de vulcão,
que volta a ser incandescente
em dia de sol quente.

Um pedaço de mata atlântica
que peneira a luz do sol

e o colibri beija flor.

Eureca






Santos Dumont:
o inventor da caneta
que traça riscos no céu.

Primeiras leituras





Guardo na memória
meus primeiros livros
com histórias de lugares fantásticos
com macieiras,
castelos,
vacas leiteiras,
baobás,
leões,
pontes de pedras,
oliveiras,
rouxinóis,
que, em meu conhecimento rudimentar,
situavam-se entre o mundo dos sonhos
e a Ilha de Madagascar.

sábado, 23 de agosto de 2014

Ruínas de Ubatuba





Aqui viveram senhores
madamas, escravos, mucamas.
Aqui aconteceram
festas de batizados,
dobre de finados,
dramas de apaixonados,
finais inesperados
(todos os finais são inesperados).
E da Fazenda Lagoinha
restou o passado soterrado
entre ruínas de alicerces
e cacos do telhado.

Romantismo antigo

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Amada minha,
Quanto mais próximo o dia
De nosso reencontro
Maior se torna
A saudade de vossos encantos
Levo um coração mal-nutrido
Que precisa de imediato socorro
Que quase morro
E desfaleço no caminho
Carente que está
De vossa atenção e carinho
Levo, também,
Um corte de pano
Cheio de cores
Para que vós, minha flor,
Estejais a ornar
Com a primavera
Que está para começar
Com saudades imensas
De um pescador
Que paga penitência
Por ser pecador
De ter-se enamorado
De vós, meu distante amor.

sábado, 9 de agosto de 2014

Reinado curto


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Quando eu construía castelos,
os fazia bem caprichados,
com paredes reforçadas,
escadas em caracol,
janelas para damas em perigo,
torres altas para vigiar o horizonte
e um fosso ao redor
cheio de água salgada
para proteger de invasões.
Fui soberano de muitos reinos
todos eles chegavam ao fim
quando a maré cheia
derruía o castelo de areia.

Tempo de estiagem

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Chega o tempo de estiagem,
tudo muda na paisagem,
quase tudo fica esturricado,
só não seca a umidade
entranhada na terra,
na proteção das copas das árvores,
no abrigo das folhas que cobrem o chão.
Essa umidade que mina na nascente,
que alimenta o córrego,
que corre para o riacho,
que deságua no ribeirão,
para matar a sede dos bichos,
para dessedentar a população
dos seres irracionais
que desmatam as nascentes
e dão fim aos mananciais.

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Juruquivi, o tupinambá

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Eu e meu povo chegamos
a um acordo com Tupã:
ele dá as águas,
a gente pesca;
ele dá a terra e a chuva,
a gente planta;
ele dá a areia branquinha da restinga,
a gente faz a casa nela
porque é mais confortável para pisar,
mais fácil de limpar,
e a vida tem mais qualidade
respirando a brisa do mar.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Já lhe contaram?


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Que são as famílias humildes
que vivem as mais duradouras
histórias de amor.
Que um simples pedido de desculpas,
para quem não sabe,
pode salvar o mundo.
E que muitas vezes
o que impede uma amizade
é só a distância de um abraço.