terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Tapeçaria


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Acho que foi com os fios da memória
que uma tecelã fez  uma trama
que mostra uma casa antiga
toda ilhada por um mar de flores.
Tecelã, leva-me também
quando pra lá fores?



segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Amadores


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É muito comum a gente ouvir
histórias de pescadores
que partem para o mar
pra nunca mais voltar.
Eles partem,
aparentemente em bom estado de corpo,
mas e a mente que está ligada
ao coração por um complexa rede
de circulação sanguínea
e sentimentos inexplicáveis?
São pescadores amadores
que não aprenderam o suficiente
pra saber até que profundidade avançar
e que é fácil se deixar levar pelo mar.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

No caminho de peabiru

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Serra acima, pelo caminho de peabiru,
eram levadas hastes da ubá
 para fazer flechas leves, velozes e certeiras;
conchas de moluscos para fazer adornos
que valiam mais do que ouro;
penas de passarinhos
para os mantos de chefes de reinos
situados na fronteira
entre a fantasia e a realidade.

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Resistência


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Não é qualquer vento ciclone
Que derruba coqueiro,
Mesmo que a palmeira seja esguia
E alcance as nuvens estratos...
PS:  em dias de cerração
As nuvens descem até ao chão.

O lugar mais bonito do mundo



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A casa de meus avós ainda existe
na região da memória
Com o terreiro de flores, laranjeiras,
Bananeiras e dois coqueiros tão antigos
que cresceram para além das esperanças
de terem os cocos ao alcance

das varas nas mãos das crianças.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Turbilhão

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Nas lonjuras do Atlântico aconteceu uma batalha
tão grande entre mar e vento
que sobrou vagas furiosas
até pra quem navegava de cabotagem
entre portos do mesmo mar
entre braços do mesmo amar
que ainda vai levar muito tempo
para ventania voltar a ser aragem
para as feridas cicatrizarem
e a gente conversar sobre isso
como se tudo fora bobagem.





Movimentos marinhos


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O pior de se envolver com o mar
é o risco de se apaixonar
e esquecer a certeza da terra
e convenções firmes sob os pés.
O melhor de ir para o mar
é criar intimidades e descobrir
que o oceano e a vida são movimentos
de correntes, marés e ventos.
(Na corrente do atlântico-sul
foi-se embora
Francisco Félix, meu parente).

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Calendas

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O calendário do caiçara
era diferente do resto do mundo
e os compromissos eram marcados
para a virada da lua,
no sopro da viração,
na florada do ipê,
quando o tempo melhorar,
no mês da enchovas
ou quando madurar a jabuticaba.
É, esse tempo passou...
e a saudade que não acaba?

Ano de 1983

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Tão longe no tempo,
tão perto do coração,
mas coração de estudante,
me desculpe o auê,
me dê motivo,
anjo,
pena que os sonhos não voltam atrás.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Domingo,29/11/15.

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Esse rabo-de-galo
essas músicas do programa Sr Brasil
estão me deixando saudosista em demasia
que nem me arrisco a pegar da caneta
pra começar uma nova poesia.

Prestidigitação

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As prestidigitações da tecelã
ao interligar fios, cores, sombras, ideias
para construir uma nova pangeia
são mais rápidas do que os olhos meus
e a mulher sorri e diz:
“Estou brincando de Deus.”

Aquarela


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É preciso fazer uma aguada de azul celeste
sem esquecer de deixar máscaras
para insinuar nuvens na tela
(sabemos que há anjos entre elas),
nuances de ouro na linha do horizonte
para contrastar com o verde-ciano
e um rebanho de ondas-carneirinhos
a povoar os campos do oceano,
por fim, pinceladas de azul-caiçara
mostram meu avô na canoa que foi buscar
o perfeito equilíbrio entre céu e mar.

sábado, 28 de novembro de 2015

Goteira sobre o poema


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As mensagens de despedidas
eram mais tristes antigamente
quando eram escritas em papel
com borrões de fácil interpretação
para quem sabia ler  nas entrelinhas:
lágrimas põem demasiados pingos nos is.

Ciência no poema



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Então, né, lembranças do que passou
e, às vezes, do que viria a ser, se condensam,
toldam os olhos e nublam o espírito.
Após a condensação atingir o ponto de saturação dos sentimentos,
ocorre a precipitação pelas glândulas lacrimais
e o choro desce aos borbotões ou discretamente,
conforme o estado geral do ser: corpo, alma e mente.

Caso verídico


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Tio Antônio tinha uma roça
que produzia milho, mandioca, feijão,
para a família, pássarinho e ladrão.
– Não vai dar parte na polícia, Antônio?
– Mas por que? Se estão tirando de mim,
que sou tão pobre, devem estar com mais fome do que eu.
Pronto, o poema-história está feito e agora está na hora
de levantar a bunda da cadeira
e ver a poesia acontecendo na igreja,
na solidariedade, nas ruas e praças da Terra:
na Síria e no Brasil têm refugiados,
de antigas e novas guerras.

Cena marinha



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O pescador sondou o céu e um anjinho piscou pra ele:
era hora de virar a última dose de cachaça,
Dom Orleans de Bragança,
aproveitar o vento a favor e levantar o pano
para ver o que tem no outro lado do mundo.

Regras a cumprir


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Quem vive com o mar sabe
que ao soprar a viração
é preciso recolher a rede, içar a vela,
erguer a âncora e retornar pra casa.
Mesmo que o pescador esteja bêbado,
ou o  poeta um tanto ébrio,
o barco e o poema chegam ao porto
porque o vento está sempre sóbrio.

Terra caiçara

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Minha vontade, mesmo,
é um dia dormir na praia do Município de Ubatuba
e acordar na Vila Nova da Exaltação
da Santa Cruz do Salvador de Ubatuba,
com todos os mangues intactos,
as praias enfeitadas de jundu
e o ubatubense voltando a ser caiçara.
E, quem sabe, assim vai acabar
a tristeza que enfeia meu poema.

Janela para o horizonte


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O mundo não é só o que existe:
gente, bicho, casa, mar, serra…
Tem também o que não existe:
sereia, boitatá, sombras…
Todo pescador sabe, por exemplo,
que tem o boitatá que corre sobre o mar
e ilumina a noite igual tatá, o fogo;
que há vultos tímidos que se escondem
nos desvãos dos mistérios;
que tem gente que sonha com santos
e tem gente que vê anjos.
Tenho dó daqueles que não tem uma casa
igual morada caiçara,
que é exatamente do tipo
que tem janelas adequadas
para espiar o outro lado da realidade.

São Sumé

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Á água do mar vem dos rios,
água dos rios vem da chuva
e a chuva vem do mar.
Até São Sumé de Ubatuba
veio caminhando sobre o mar
trazendo a ciência de fazer farinha de mandioca,
que ensinou ao meu parente tupinambá.
E só, pois que peixe bom e coentro para fazer pirão
já tinha neste lado do paraíso.

Só podia dar nisso

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Bem que mamãe sempre dizia
pra gente se contentar
com as praias de nossa baía
e havendo vontade de ir mais além
que conhecêssemos as bordas do oceano,
mas que nunca fôssemos nos aventurar
no lado de lá das montanhas,
pois que somos povo do mar
e não estamos acostumados
aos ritmos de quem precisa
se tornar áspero como o sertão
pra tirar o sustento do chão.

Blues poems



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Billie Holiday:
“Quando nasci,
eu, mamãe e papai éramos crianças.”

No way

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Os acertos são variados
cada qual com sua peculiaridade,
já os erros são sempre os mesmos,
escritos ou vividos,
nas Ilhas Marianas,
no outro lado da lua,
no quintal do vizinho
motivos de tantos desalinhos
de roupas, cabelos e destinos.

sábado, 24 de outubro de 2015

Caiu na rede é peixe

namorado
bonito
parati
perna-de-moça.

Aula de história


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Que coisa é o mundo,
D.Pedro, o último,
era pra ser somente o segundo.

Inconveniências

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Batidas em portas e janelas…
não vou atender, que voltem outro dia,
fantasmas cismam em fazer visitas
nos dias de ventania.

Homofonia

Feliz de quem ainda por aí descalço,
pisando em pedras e espinhos gramaticais,
não se importando com os puristas
e nem se vê em complicações
se assiste a um conserto ou um concerto,
se dá um cheque ou um xeque,
se prepara um cesto ou um sexto,
se faz um cozido ou um cosido…
eu mesmo, numa situação destas,
fiquei estático e extático,
quando uma moça contou-me em segredo,
que estava, céus!, com inflamação no nervo asiático.

Extinção

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Ditadura, pobreza, caçadas ilegais,
tanto atraso em algumas regiões d’África,
que o outrora rinoceronte,
hoje é rinocerontem.

Memória


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Quero registrar aqui
os nomes de meus antepassados
cujos domínios se estendiam
desde os esporões da Serrinha da Fortaleza
até ao oceano e adjacências,
incluindo as alvoradas,
o mar e suas candências:
Laurentina e Almiro Mesquita,
Ana e Manoel Almiro,
Maria e Genésio dos Santos,
Eugênia e José Almiro,
todos caiçaras de fé, casos de pescarias
e outras formas de poesias.

Insight

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À sombra de um guarda-sol ou palma
muita gente teve a revelação
que o caiçara sabe desde criancinha:
água do mar é bom pra lavar a alma.

Herança

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O mundo se encontrava
no quintal de meus avós:
o cheiro do limão cravo,
o gosto do cambucá
e as cores da flor do beijo.
O primeiro veio de portugal,
o segundo é tupinambá
e o beijo é iorubá.

Viagem para o outro lado do mundo

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Meu avô cruzava a Baía da Fortaleza até à Praia do Lázaro,
deixava a canoa no jundu
e tomava o ônibus da Viação Atlântico
para ir à Vila de Ubatuba comprar quase nada:
macarrão padre-nosso, manteiga viação,
biscoutos aymoré, queijo do reino,
cartuchos CBC, linhas e anzóis.
O resto era plantado, criado,
caçado ou pescado por nós.

quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Sinais


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Eu estava viajando para longe
e espiando pela janela do ônibus
a imensidão do Brasil rural,
quando vi uma casa bonitinha de capiau
soltando sinais de fumaça pela chaminé,
consultei o dicionário dos índios das pradarias,
que todo mundo precisa ter na bagagem,
e logo dei o sinal de parada,
“arroz, tutu e galinha com quiabo”
é o que dizia a mensagem.

Ulisses


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Eu estava navegando,
obedecendo direitinho às normas,
a todo pano em tempo bom,
respeitando o vento forte,
desviando das sereias,
perseguindo a boa sorte,
seguindo meu caminho…
Mas o oceano é tão grande, meu bem,
e eu estava tão sozinho.




Quem não tem cão, caça com gato.
É um bom ditado
pra quem está sem cachorro no mato.

H2O


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Lixo, esgoto, metais pesados
lixo tóxico corre pro rio,
onde isso vai parar?
o rio corre para o mar…
tem plástico até na barriga da tartaruga…
esta água é doce?
Toda lágrima é de  amargar.

Praia isolada


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Quando nossa praia era isolada,
após o almoço, todo mundo ficava, 
como bons cristãos,
pinchados pelos cantos das casas
ou nas sombras do jundú.
Seus anjos da guarda
também se sentiam no paraíso.

Calmaria

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o vento parou e o mar
parece que foi nivelado com régua de pedreiro,
tudo calmo, tudo bem acomodado
na superfície oceânica.
Mas, nas profundezas do líquido amniótico,
boto caça sardinha,
polvo devora caranguejo,
tubarão engole polvo,
jubarte come camarão
e eu pesco garoupa
pra garantir o pirão.