terça-feira, 26 de março de 2024

Mar sem fim

 

Adeus, mamãe, vou pescar,

e a senhora sabe,

não dá para saber a hora de voltar,

vai que os peixes estão beliscando,

vai que o vento está soprando;

vai que encontro uma sereia,

vai que ela me desnorteia.

 

Peixe não tem endereço, mamãe,

e o pescador é seu vizinho,

cardume não marca encontro

e a incerteza é seu destino.

 

Adeus, mamãe, reze por mim,

Eu vou pescar no mar sem fim,

Sem fim, sem fim, sem fim...

Quebre o sistema, salve o ecossistema!

 

Os tolos aspergiram inseticidas de avião

mataram abelhas, joaninhas e passarinhos,

o gafanhoto virou praga,

acabou a polinização

e o silêncio tomou conta da criação.

 

Quebre o sistema, salve o ecossistema;

Quebre o sistema, salve o ecossistema!

 

Os egoístas aterraram os manguezais

para construir marinas e condomínios

taparam as tocas dos guaiamús

e jogaram esgotos no mar para desgosto do caiçara,

para adoecer a tal ponto as baleias,

que, por tristeza, se suicidam nas areias.

 

Quebre o sistema, salve o ecossistema;

Quebre o sistema, salve o ecossistema!

 

E quem bota fogo na mata

é igual quem joga lixo no rio;

que é igual quem aterra e mata o mangue;

que é igual quem derrama o sangue

de bicho, estranho, irmão, irmã;

que é igual quem derrama petróleo no mar;

que é igual quem dá agrotóxico para a terra beber;

que é igual quem faz Nossa Senhora chorar.

 

Quebre o sistema, salve o ecossistema;

Quebre o sistema, salve o ecossistema!

domingo, 24 de março de 2024

No breu.


No breu,

No breu da noite nublada do mar de fora, sem bússola, sem visão do litoral, sem solução, com risco de morrer pagão.

No breu, na noite nublada do mar de fora, sem visão do litoral, sem solução, com risco de morrer pagão, em quase desespero, rogue a Deus que se abram as nuvens para mostrar o setestrêlo.

No breu, no mar de fora, sem solução, com risco de morrer pagão, em quase desespero, peça a Deus que se abram as nuvens para mostrar o setestrêlo e achar o rumo de um porto seguro, para os braços de Senhora dos Navegantes, que dá proteção para quem foi pescar distante, distante da segurança, perto do perigo,  muito longe da esperança. 

No breu sem solução, com risco de morrer pagão, no breu sem visão, no breu...

sábado, 23 de março de 2024

Escola caiçara

 

De bem com a vida,

aprendi na escola caiçara

como remar a canoa,

o jeito certo de pescar,

a levar tudo numa boa,

a respeitar e amar o mar.

 

Toda uma herança de sabedorias

e mais a prática do dia-a-dia

na escola do pescador até aprender

a ler no céu o que vai acontecer

com o tempo que ainda não mudou,

a espiar as correntes marinhas

atrás do pescado que se ocultou

e saber que peixe mordeu a isca

e aquele que escapou.

 

E desde os tempos de menino,

Aprendi que a gente vive por teimar,

pois quem nasce à beira-mar

tem o destino escrito na areia

e se a onda vem e apaga tudo,

e se não der peixe na linhada,

e se vier pouco peixe no espinhel

ainda tem a rede armada

no pesqueiro do parcel.

Este mar está cheio de vida,

(mas já teve mais!)

este mar ainda é generoso

(mas já foi mais!)

Quando a gente chegava da pescaria

com uma fieira de peixes na mão,

vovó  nos abençoava e dizia:

"Quando Jesus andou no mundo

procurando seguidores,

escolheu os melhores

no meio dos pescadores."

sábado, 16 de março de 2024

Cantiga de passarinho

 

 

Gosto de poemas de cantigas de passarinhos

cantadas de geração em geração

nos galhos das fruteiras carregadas

e nem precisam ser poemas

com as palavras rimadas:

Viva João-de-barro, sem-fim, saírinha,

pica-pau, tucano, sabiá, tiziu,

jacu, seriema, andorinha!

Sabia, meu bem, 

que saudade é nome de passarinho,

e que tô com saudade de você também?

Um abraço sanhaço, saíra, azulão-da-serra,

coleirinha, bigodinho, periquito,

 tico-tico, tiziu, canário-da-terra!

Voa curió, carcará, urubu-rei,

irerê, quero-quero bem te ver,

bem-te-vi, bem te verei!

Sabia, meu bem, 

que saudade é nome de passarinho,

e que tô com saudade de você também?

sábado, 9 de março de 2024

Vida que pulsa

 

No quintal tem uma gostosa confusão

de latidos, cacarejos, grasnidos de bichos,

risos e gritos de crianças no quintal

que, logo, vão para a escola,

então haverá uma trégua

e a rotina voltará a ser sossegada

neste pedaço da pátria amada.