terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

Procura-se





Relógio que marca as horas
como nenhum outro faz igual,
que marca com delicadeza
as horas amargas
e com alegria, as horas amigas.
E ainda: a hora h,
a hora onça beber água,
as horas do ângelus
e a hora de tirar o cavalinho da chuva.




Manha



Em tempos de sobressaltos,
disse alguém cheio de manha,
o coração não bate, só apanha.

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Anos 70


O mesmo rádio que tocava tropicália
trazia notícias do que acontecia
no país dos generais
preocupados com os padrões morais,
censurando a arte e a geleia geral,
mandando para o exílio
Paulo Freire, Chico Buarque,
Brizola, Darcy Ribeiro, Gilberto Gil,
o irmão do Henfil
e outros elementos perigosos
que poderiam subverter o que
nem podíamos saber.


quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

Quando as pessoas tinham alma


Quando os alimentos para o corpo vinham do mar e da terra
e os alimentos da alma vinham direto do céu,
Quando nossos caminhos eram por cima das ondas,
os peixes vinham do mar,
as frutas vinham do pomar da Serra do Mar:
jabuticaba, coco brejaúba,
ai, a amizade tem gosto de cambucá.

terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

O maior mandamento





Amarás a Deus, aos pais,
aos próximos, e ainda,
às matas, aos rios,
aos animais e mais,
dedicarás amor aos anjos
que querem nos vencer pelo amor.
Quem amará mais?






sábado, 17 de fevereiro de 2018

Um certo João












Muito prazer,
meu nome é João,
cabelos ao vento,
pés descalços no chão,
sou filho da terra,
guardião da palavra,
irmão do trovão,
e falo com experiência
de quem cuidou da mãe do amor.
Os males do mundo,
muita gente sabe,
começam no coração
e lá onde principia a doença
está a solução.
Sim, o mundo está torto
e eu tenho a solução,
muito prazer, meu nome é João.






quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Chove a cântaros



O dia está desbotando
por causa de tanta chuva,
tanta água na janela,
igual pintura
com excesso de água na aquarela,

Chega de chatice



Nenhum Santo levitando,
não tem água transformada em vinho,
nenhuma penugem de anjo...
Que coisa chata, meu Deus,
é o céu dos ateus!

Inventário de alegrias








Crianças veem  melhor e mais
do que o comum dos mortais
por exemplo, uma pena no quintal
com certeza caiu da asa de um anjo;
uma folha de papel
é uma tela em branco ou um avião em potencial
à espera de ganhar o céu
e as árvores sacudidas pelos ventos
estão, entre si, fazendo cumprimentos.





terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

Enquanto isso na estrada


Durante a viagem,
quando o relógio e a distância estiverem em desacordo,
pare na primeira barraca
peça uma pamonha da roça
e esqueça o problema,
antes faltar ao compromisso
do que perder o poema.

sábado, 10 de fevereiro de 2018

Fio de Ariadne






Escritor experiente
não se perde nas histórias,
viagem ao passado
só com um bom fio de memórias.

Até quando?



Até quando vai imperar
a economia de mercado,
o cabra marcado,
a faca entredentes,
a lei do mais forte,
a monocultura no campo semeado,
o leite tirado do bezerro desmamado,
o mundo semi-árido?

Viva a vida!




Quebre o sistema,
não o ecossistema!





Tempo de reconstruir











Já que o mundo está louco
e os sinais estão invertidos,
o que era certo agora é errado
e o que era errado agora é certo,
alinho-me no time dos doidos
que andam com os bolsos cheios
de sementes
que olham para os lados
para ver se ninguém está reparando,
procuram um chão fértil,
e, de repente, deixam cair no chão
todo um ecossistema.

domingo, 4 de fevereiro de 2018

Do reino dos atlantes



A montanha dos Atlas,
o oceano atlântico,
os seus olhos atlânticos
e a mata atlântica é o que ficou.
O restante da Atlântida afundou.

SOS


Cunhambebe,
Castro Alves,
José do Patrocínio,
Joaquim José da Silva Xavier,
Ganga Zumba,
Zumbi dos Palmares,
Sobral Pinto,
JK,
Princesa Isabelzinha,
quem haverá de nos salvar?

Infância normal



Criança tem que ficar descalça,
correr, pular, brincar na rua,
experimentar a aragem de frio,
subir em árvores,
ter um cachorro para chamar de seu,
pular dentro do rio,
comer goiaba nos galhos da goiabeira,
construir os próprios brinquedos
para ter histórias para contar a vida inteira.



Nota histórica










Os europeus,
meus antepassados e seus,
trouxeram a morte,
cortaram a mata,
sujaram o rio,
mataram o bicho,
provocaram a cizânia,
e deixaram o continente assim
todo dividido,
20 países,
proprietários e proletários,
governantes e governados,
fascistas e libertários,
e deram o nome de América Latina.
Agora quem vai limpar a latrina?